Marketing social no turismo: uma revisão sistemática da literatura

1. Introdução
O turismo é uma das atividades económicas mais relevantes (Hunter, 1997; Truong & Hall,2013; United Nation Environmental Programme [UNEP], 2005,2009; United Nations World Tourism Organization [UNWTO], 2015). Para além do seu impacte económico positivo é um setor que pode contribuir de forma considerável para o desenvolvimento equilibrado e sustentável dos territórios (Han, Hsu, &Lee,2009; UNEP, 2005). Esta forma de desenvolver o turismo permite satisfazer “as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir as suas próprias necessidades” (World Commission on Environment and Development [WCED] 1987,p.16). No entanto, esta atividade económica, se não for planeada seguindo os princípios da sustentabilidade, pode também gerar impactes nefastos significativos (Gössling, Scott, Hall, Ceron & Dubois, 2012; Han et al., 2009; Sharpley, 2001; UNEP, 2005). É, pois, necessário refletir como mitigar estes efeitos negativos de forma a assegurar que o turismo tenha um papel substancial no desenvolvimento territorial equilibrado. Visto que muitos desses impactes são de natureza antrópica, sobretudo relacionados com os comportamentos pouco sustentáveis dos intervenientes do setor (Budeanu, 2007), é fundamental refletir nas possíveis ferramentas que podem ajudar a alterar essas condutas. Com efeito, ao tentar “dominar, aproveitar e utilizar a natureza” (Liu, 2003 p.472), o ser humano, levanta graves problemas aos objetivos da sustentabilidade (Liu, 2003). Uma dessas ferramentas é o marketing social (Hall, 2016; MacFadyen, Stead, & Hastings 1999; Truong & Hall, 2013, 2015a, 2015b, 2017). Este tipo de marketing utiliza os “conceitos e ferramentas do marketing comercial para criar mudanças comportamentais” (Hall, 2014,p.1). Essas alterações de conduta são de carácter voluntário (Dinan & Sargeant 2000; Kaczynski, 2008; Truong & Hall, 2015b, 2017) e permitem beneficiar os indivíduos e a sociedade (Bright 2000).
O marketing social, apesar de criticado aquando do seu aparecimento, tem conseguido desenvolver-se como um campo específico nos últimos 40 anos (Gregory-Smith,Wells, Manika & McElroy, 2017). Como consequência, nas últimas décadas, tem crescido em importância e tem sido aplicado numa variedade de problemas sociais e ambientais (Fox & Kotler, 1980; Gregory-Smith et al., 2017; Hall, 2014), em diferentes temas como a sustentabilidade (Gregory-Smith et al., 2017; Hall, 2014) e em diversos setores como o turismo (Hall, 2014; Truong, Dang, Hall & Dong, 2015c; Truong & Hall, 2013, 2015a, 2015b). Dadas as suas singularidades, o marketing social tem vindo a ter um crescente reconhecimento no turismo (Hall, 2014). Este interesse progressivo tem aumentado a expansão de investigações sobre o tópico, sobretudo nos anos recentes. Diante de um número cada vez maior de linhas de pesquisa e da incerteza sobre a influência que este tipo de marketing pode ter no que concerne à resolução dos impactes negativos do turismo, é necessário um esclarecimento profundo sobre esta relação. Por conseguinte, este artigo tem dois objetivos gerais que se interrelacionam. Primeiro, verificar se há evidências científicas para comprovar se o marketing social tem contribuído para um turismo mais sustentável e de baixo impacte. Segundo, analisar o estado da arte e sintetizá-lo para compreender o que já foi aprendido, os caminhos já investigados e as áreas ainda por explorar. Com este propósito presente, procura-se fornecer uma visão abrangente dos estudos e conhecimentos alcançados para não só compreender melhor esta relação, mas também possibilitar a consolidação da informação, encorajar a reflexão e orientar pesquisas futuras.
Para responder a estes desafios propostos, o artigo baseia-se numa revisão sistemática da literatura de 46 artigos. Estes artigos foram selecionados na base de dados - Scopus e Science Direct - e examinados posteriormente com o método de análise de conteúdo e técnicas biométricas.
Primeiro, o artigo fornece uma revisão abrangente do desenvolvimento da literatura relativa ao marketing social e o seu contexto no turismo. Seguidamente, descreve-se a metodologia aplicada no presente artigo e, na secção seguinte, analisa-se e discute-se os resultados do estudo bem como se identificam caminhos promissores para futuras pesquisas. Por fim, na última secção, apresentam-se as conclusões e as respostas às questões centrais do estudo bem como as suas limitações.
2. Contextualização teórica
2.1 O turismo e o marketing social
O turismo é uma atividade económica relevante, rentável e em rápido crescimento (Hall, 2014; Sirakaya & Sonmez, 2000; Truong & Hall, 2013; UNEP, 2009; UNWTO, 2015).
Apesar dos seus efeitos benéficos, cria também impactes negativos significativos (Hall, 2014; Truong & Hall, 2013; UNEP, 2009; UNWTO, 2015). A título de exemplo, cria injustiças a nível de uso dos recursos (Gössling, Hall & Scott, 2015), pressão considerável sobre as comunidades devido ao ultrapassar do limite da capacidade de carga social (Hibner, Taczanowska, Zieba, Brandenburg, Muhar & Balon, 2018) e exploração sexual das comunidades locais (Jebarajakirthy, Thaichon, Sivapalan, 2017). Pode ainda contribuir para as alterações climáticas globais (Babakhani, Ritchie & Dolnicar, 2016; Borden, Coles, Shaw, 2017), degradação dos recursos, como a energia e a água (Scott, Gössling, Hall & Peeters,2016; Wells, Taheri, Gregory-Smith & Manika, 2016), geração de lixo e ruído (Perez-Mujica, Duncan & Bossomaier, 2014) bem como sofrimento dos animais que são explorados para fins turísticos (World Animal Protecting [WAP], s.d).
Muitos destes impactes são de origem antrópica, provocados pelo comportamento humano dos diferentes stakeholders do turismo (decisores políticos, empresários, residentes, turistas e colaboradores) (Budeanu, 2007). Estes comportamentos são um dos principais obstáculos para o turismo sustentável (Budeanu, 2007). Dado que as mudanças nos comportamentos individuais e públicos são essenciais para a sustentabilidade (Truong e Hall, 2015b), é necessário focar a atenção em ferramentas que contribuam para alterar estas condutas de forma voluntária (Higham, Cohen,Peeters, Gossling, 2013). O marketing social, devido às suas particularidades, pode contribuir para desenvolver comportamentos mais adequados nestes stakeholders (Hall, 2014). Como menciona Hall (2014, p.2) este tipo de marketing “[…], tem o potencial de influenciar comportamentos pessoais, comunitários e empresariais em todo o sistema de turismo”. Este marketing surge, na década de 1950, pela voz do sociólogo Wiebe (1951), mas só na década de 1970, é formalmente definido por Kotler & Zaltman (1971) (Andreasen, 1994,2002; Dinan & Sargeant, 2000; Hall, 2014, 2016; MacFdyen et al., 1999; Truong & Hall. 2015a, 2015b).
Aplicado primeiramente em contexto de planeamento familiar, nos últimos anos, tem sido crescente a sua aplicação no turismo (Hall, 2014). Reconhecido como potencialmente importante para o turismo (Hall, 2014), o marketing social é cada vez mais encarado como um possível contributo positivo para o papel do turismo para a sustentabilidade (Hall, 2014, 2016; Truong & Hall, 2013, 2015a, 2015b, 2017). No entanto, uma análise mais profunda do seu real impacte é necessário. Por conseguinte, esta análise é desenvolvida.
3. Metodologia
Para alcançar os objetivos propostos, foi utilizada a revisão sistemática da literatura visto que contribui para uma melhor organização e sistematização do conhecimento existente (Grant & Booth, 2009; Mihalache & Mihalache 2015; Smith, Devane, Begley & Clarke, 2011; Tranfield, Denyer & Smart, 2003; Wang & Chugh 2014). Para tal, foi utilizada a abordagem da revisão sistemática da literatura proposta por Khan, Kunz, Kleiinen e Antes (2003) e Denyer e Tranfield (2009) que está sumariamente descrita no quadro 1.
4. Resultados e discussão
4.1 Análise estatística descritiva
Dos 46 artigos analisados, pode-se constatar através da figura 1 que a grande maioria das publicações (35 artigos ou 76%) remonta a anos recentes, sobretudo na última década (2007-2012 e 2013-2018). É de notar a evolução positiva ao longo dos anos analisados e contata-se assim a contemporaneidade e o crescente interesse deste tópico na disciplina do turismo.
A figura mostra ainda que quase metade dos artigos - 47,8% (22) - foi publicada durante 2013-2018 e que os períodos antes de 2007 apresentam parcas publicações, perfazendo um total de apenas 23,9% (13), existindo mesmo duas décadas sem publicações (1983-1988 e 1989-1994).
Seguidamente, foi realizada a análise da contribuição do periódico (Quadro 2), visto esta permitir prover uma visão geral do padrão das publicações de um determinado tópico (Rehn, Kronman,Wadskog 2007). Relativamente a esta análise, existem 28 títulos de periódicos distintos, revistos por pares, e um livro que publicaram o tópico em análise com uma contribuição mínima de um e máxima de 12 artigos. Constata-se que o Journal of Sustainable Tourism é o periódico com mais publicações (26,1%) seguido do Tourism Management (8,7%). Os quatro periódicos restantes com mais de uma publicação são: Australasian Marketing, Journal Of Ecotourism, Journal of Travel Research e Social Marketing Quarterly, todos com 4,4%.
O facto de o Journal of Sustainable Tourism ser o periódico com mais publicações pode sugerir que o marketing social está intimamente relacionado com o conceito de sustentabilidade no turismo. A diversidade dos periódicos (28) pode sugerir a vasta panóplia de áreas e temas de investigações. De referir ainda que os periódicos orientados especificamente para o marketing social, como é o caso de Journal of Nonprofit & Public Sector Marketing (1) e Social Marketing Quarterly (2), apresentam poucos estudos (6,6%) na área do turismo, num total de 3 em 46.
Foram ainda analisados os principais países estudados nas investigações empíricas (Figura 2). Com estes dados, procura-se averiguar que países têm contribuído ou têm sido alvo de investigações.
Os dados da figura revelam que, dos dez países mencionados, as investigações foram maioritariamente realizadas em economias desenvolvidas e menos atenção tem sido dada às regiões em vias de desenvolvimento, como África. É ainda de sublinhar que, no continente europeu, a Inglaterra é quase o único país, à exceção da Croácia, onde foram realizadas pesquisas. Existem apenas três investigações internacionais (investigação realizada em mais que um país). Estas informações demonstram que há claramente um deficit de pesquisas, que será posteriormente referido na secção 4.4.
4.2 Análise quanto aos clusters
Através da metodologia qualitativa (análise de conteúdo), os artigos coletados foram analisados para identificar os principais tópicos da literatura estudados sobre este tema. Esta identificação, seguindo a recomendação de Gast, Gundolf e Cesinger (2017), consistiu em duas etapas: encontrar semelhanças no conteúdo (os tópicos comuns e os pontos focais) e interpretar subsequentemente essas semelhanças (identificar conexões entre eles). Estas etapas permitiram que os artigos com assuntos análogos fossem agrupados e categorizados em sete clusters principais de investigações: 1) o marketing social no turismo aplicado ao género; 2) demarketing; 3) as teorias aplicadas ao marketing social no turismo; 4) o marketing social aplicado aos destinos; 5) o estudo da mensagem (comunicação) no marketing social aplicado ao turismo; 6) o marketing social aplicado aos diferentes stakeholders do turismo e 7) discurso geral (marketing social no turismo) (Figura 3).
Com base na quantidade de estudos, o cluster 6 (o marketing social no turismo aplicado aos diferentes stakeholders desta indústria) e o cluster 4 (o marketing social no turismo aplicado aos destinos) com dezoito e oito trabalhos, respetivamente, receberam a maior atenção dos pesquisadores.
4.2.1 O marketing social no turismo aplicado ao género
Este cluster centra-se no estudo do género em contexto de marketing social no turismo. Dentro desta linha de investigação, é de notar que existem poucos estudos que aprofundam este tema (N=3). Ao cruzar os três estudos (Chhabra, Andereck, Yamanoi & Plunkett, 2011; Chhadra & Johnston, 2011; Sirakaya & Sonmez, 2000), verifica-se que a metodologia aplicada é a mesma (análise de panfletos). Esta situação pode suscitar limitações às conclusões, dado não haver métodos diferentes. Os resultados destes estudos revelam que há manipulação das imagens relativamente às mulheres, retratando-as de forma estereotipada, na publicidade. Segundo os autores, a aplicação do marketing social “upstream” poderá minimizar estas representações irrealistas e atuar como um mecanismo de controlo social eficaz em futuras mensagens de marketing.
4.2.2 Demarketing
O demarketing foi agrupado no cluster 2 e apresenta-se como uma área ainda recente com cinco artigos no total analisados. É uma área importante a explorar visto que mitiga um dos problemas ambientais mais relevantes causados pelo setor do turismo - o excesso de turistas que ultrapassa a capacidade de carga dos destinos turísticos (Hjalager, 1997). A principal conclusão é que o demarketing pode ser relevante para aumentar a consciência ambiental (Magalhães, Magalhães, Rodrigues & Marques, 2017), gerir a capacidade de carga dos locais e incentivar o turismo sustentável (Beeton & Benfield, 2002; Beeten & Pinge,2003). Contudo, para ser eficaz, deve-se combinar as políticas de marketing / demarketing com a segmentação (Moeller, Dolnicar, Leisch, 2011). Igualmente relevante, é reconhecer e planear as campanhas de demarketing, estruturando-as com as características do marketing social (Armstrong & Kern,2011).
4.2.3 As teorias aplicadas ao marketing social no turismo
O marketing social, ao procurar entender e alterar condutas, necessita dos fundamentos teóricos que os paradigmas e teorias sobre o comportamento humano proporcionam. Apesar desta necessidade, existem poucos artigos que especificamente aprofundam este tópico (N=3). O artigo de Kim, Borges, Chon (2006) utiliza o Novo Paradigma Ambiental (NPA), Mair & Laing (2013), o modelo transteórico, e Jebarajakirthy, et al. (2017) combina a Teoria do Comportamento Planeado com a Teoria dos Estágios da Mudança. Estes autores defendem, no contexto do marketing social, o valor destes modelos e teorias para facilitarem comportamentos pró-ambientais (Kim et al., 2006; Mair & Laing, 2013) e sociais (práticas sexuais seguras no turismo) (Jebarajakirthy, et al., 2017).
4.2.4 O marketing social aplicado aos destinos
Com um total de oito artigos, o cluster 4 inclui estudos que direcionam o marketing social para os destinos turísticos. Neste tópico, encontram-se os dois autores pioneiros que mencionaram a aplicação do marketing social no turismo - Cowell (1979) e Bright (2000). Este último autor, em conjunto com Matarrita-Cascante, Brennan & Luloff (2010), Miller & Pitaluga (2001), Perez-Mujica, et al. (2014) bem como Russel, Mort e Hume (2009) concluem que o marketing social, ao priorizar o bem-estar individual e social, contribui para estimular o uso apropriado dos locais turísticos. Os seus estudos concluem que este tipo de marketing, nos parques naturais (Bright,2000), nas zonas húmidas (Perez-Mujica, et al. (2014), nos parques arqueológicos (Miller & Pitaluga, 2001), nas cidades (Matarrita-Cascante, et al., 2010; Russel et al., 2009) e em produtos turísticos, como o turismo de gang (Zerva, 2013), pode contribuir para melhorar os locais a nível de benefícios sociais, sustentabilidade ecológica e económica. Apesar de vários autores serem consensuais na relevância do uso deste marketing no turismo ele é, como refere Eagle, Hamann e Low (2016), ainda pouco utilizado.
4.2.5 O estudo da mensagem (comunicação) no marketing social aplicado ao turismo
Este cluster 5, com apenas dois artigos, aborda um dos marketing-mix - a comunicação/promoção. Ambos os autores procuram relacionar a persuasão que as mensagens de um programa de marketing social podem ter na alteração de comportamento dos consumidores. Tanto Babakhani, et al. (2016) como Shang, Basil e Wymer (2010) concluem que a mensagem tem um papel preponderante na alteração do comportamento.
4.2.6 O marketing social aplicado aos diferentes stakeholders do turismo
Este cluster, com um maior número de investigações, está dividido em quatro subgrupos, como demonstra a figura 4 - 28% empresários (5); 11% dos artigos debruça-se sobre os empregados da indústria empregados (2); 17% é dedicado à comunidade local (3) e o último, o maior, com 44% é referente aos turistas (8).
• Empresários
Borden, et al. (2017) concluem que as pequenas e médias empresas podem ter um papel significativo para promover a sustentabilidade. Porém, são as grandes empresas que têm uma maior vantagem competitiva se aplicarem o marketing social. É ainda essencial que os empresários tenham um papel mais proativo nas campanhas de marketing social (Lai & Shafer, 2005, Moscardo & Hughes,2018). O uso deste marketing deve ser também aplicado para alterar determinados comportamentos dos empresários (George & Frey, 2010).
• Empregados
O artigo de Wells, Manika, Gregory-Smith, Taheri & McCowlen (2015) e de Wells et al. (2016) conclui que existem determinadas variáveis individuais dos funcionários/colaboradores que devem ser consideradas no design de campanhas de marketing social para encorajar e desenvolver o comportamento ambiental destes.
• Comunidades locais
Segundo Horak, Marusic e Tomljenovic (2003), a comunicação direta com os residentes locais (cara-a-cara) é a mais eficaz, pois permite aumentar o nível de conhecimento e a consciencialização. O artigo de Nagla (2010) sugere que a comunidade local tem uma atitude positiva em relação ao marketing social.
• Turistas
Existem vários estudos que se dedicam à segmentação dos turistas para melhor atuar e aperfeiçoar as abordagens de marketing social (Barr, et al., 2011a). Os estudos segmentam os turistas com comportamentos distintos sustentáveis (Dinan & Sargean, 2000) e tentam perceber discrepâncias de comportamentos sustentáveis em contexto de casa e em viagem (Barr, Shaw & Coles, 2011a, b; Barr & Prillwitz, 2012).
Outra linha de investigação defende que o marketing social não é suficiente para alterar comportamentos nocivos dos turistas para o ambiente, especificamente, em contexto de alterações climáticas (Higham, Cohen, Cavaliere, Reis & Finkler, 2016) e mobilidade e consumo sustentável (Hall, 2013). Todos estes artigos não negam o valor do marketing social, no entanto, mencionam outros elementos vitais, como os sistemas sociotécnicos na influência desses comportamentos. Todavia, Mattila, Apostolopoulos, Sonmez, Yu & Sasidharan (2001) e McLennan, Becken, Battye & So (2014) defendem que determinados comportamentos podem ser mitigados através de campanhas de marketing social.
4.2.7 Discurso geral (marketing social no turismo)
No cluster 7, estão agrupados, num total de sete artigos, os estudos que aprofundam o marketing social, no campo académico do turismo. No âmbito geral, a fundamentação filosófica do marketing social defende que este marketing é mais ético e mais sustentável para os serviços do turismo (Kaczynski, 2008) e permite mudanças de comportamento (Truong & Hall, 2013). No entanto, Truong & Hall (2015b) e Hall (2016), ao examinarem como e em que medida o marketing social tem sido estudado no campo do turismo, concluem que existem várias lacunas na pesquisa.
4.3 Análise quanto à metodologia dos artigos
Através desta análise, procura-se “fornecer um ângulo interessante para uma revisão mais aprofundada da literatura” (Schlegelmilch & Oberseder,2010, p.15). A metodologia aplicada nas diferentes pesquisas está sumariada no Quadro 3. Dos 46 artigos pesquisados, 12 são de natureza conceptual. Dos restantes artigos de natureza empírica, apenas dois artigos adotaram a triangulação. É de notar que ambos os artigos são muito recentes. Este facto confirma a tendência atual, como afirmam Pardal e Lopes (2011), de associar a metodologia qualitativa e quantitativa com o objetivo de mitigar os aspetos menos positivos de cada uma. Os restantes artigos optaram pela metodologia qualitativa e quantitativa, com igual valor (16).
É de notar ainda o facto de, em anos recentes, como o período de 2013-2018, os estudos ainda estarem muito focados nas pesquisas qualitativas (36,4%) e conceptuais (58,3%), o que pode indicar que o tópico é ainda um campo muito recente a nível académico (Gast, et al., 2017).
4.4 Lacunas e pesquisas futuras
No Quadro 4, as lacunas nos atuais estudos publicados sobre este tópico são sistematizadas e reunidas para auxiliar futuras investigações na área.
5. Conclusões
O turismo, enquanto setor relevante para a economia e desenvolvimento dos destinos, é também uma indústria que cria impactes significativos para os mesmos, sobretudo devido aos comportamentos menos sustentáveis dos seus intervenientes. O marketing social, com o propósito de alterar voluntariamente comportamentos menos adequados, poderá ser uma mais-valia no turismo, para que este se torne mais sustentável.
Tendo em conta as questões levantadas, pode concluir-se que, relativamente à primeira questão (como está a ser desenvolvida a pesquisa do marketing social no turismo?), há um interesse crescente em estudos que tentam estabelecer o estado atual do conhecimento dentro de diferentes áreas do marketing social no turismo. No entanto, apesar de crescente, o interesse por este tópico é relativamente recente, apresentando ainda muitos artigos conceptuais. Além disso, os dados revelam que, no contexto geral de estudos académicos, as investigações sobre esta relação são parcas. Esta constatação está de acordo com a opinião de vários autores, desde os anos mais antigos, como Dinan and Sargeant (2000), aos mais recentes, como Gregory-et al. (2017), Hall (2013) e Truong & Hall, (2013, 2015a, 2015b, 2017). Esta realidade pode indicar que ainda não há uma evolução suficiente deste campo de investigação e que existem vários tópicos por explorar. Adicionalmente, os jornais vocacionados para o marketing social apresentam poucos estudos sobre o setor do turismo. A análise revela também que há uma dominância do Journal of Sustainable Tourism, o que pode sugerir a relação forte entre este tipo de marketing e a sustentabilidade.
Relativamente à questão 2 (quais as áreas onde está a ser desenvolvido o conhecimento?), esta análise revela que existem sete clusters (áreas) de investigação, sendo duas dominantes, nomeadamente o cluster 6 e o cluster 4. Contrariamente, o cluster 1 e o cluster 3 são os menos explorados.
Na questão 3 (existem lacunas neste campo de investigação que permitam novos caminhos de pesquisa?), este trabalho revela várias lacunas, provavelmente, pelo facto de estarmos perante um tópico ainda pouco explorado. Nesta linha de observação, há várias áreas de pesquisa, por exemplo, teorias comportamentais direcionadas para o marketing social que ajudam a garantir que os profissionais de marketing e pesquisadores sociais disseminam melhor o pensamento do público-alvo. A análise revela também que vários estudos mencionam apenas o marketing social como um possível elemento de mudança para alcançar comportamentos mais benéficos e sustentáveis. Por conseguinte e inevitavelmente, faltam estudos empíricos que comprovem a eficácia do marketing social no turismo. Nesta linha de pensamento, é necessário ainda desenvolver pesquisa longitudinal capaz de fornecer informações sobre o real impacte das campanhas de marketing social aplicadas ao turismo e investir em indicadores que permitam avaliar essas mudanças comportamentais. Existe também a necessidade de pesquisas que integrem todos os elementos que diferenciam o marketing social nas campanhas aplicadas ao turismo. Por fim, é de notar que quase todos os estudos foram direcionados para a dimensão ambiental e que é importante investir em pesquisas relacionadas com a dimensão social.
Subsequentemente, estas últimas conclusões permitem responder, em parte, à questão central deste presente trabalho (há evidências científicas e académicas para concluir que o marketing social contribui para um turismo mais sustentável?). Com exceção do demarketing, poucos estudos (eg: Wells et al.,2015; Trung & Hall, 2013) procuraram aplicar a teoria na prática. Assim, existem ainda poucas evidências académicas para responder à pergunta, o que revela uma certa urgência que deve ser colmatada a nível académico.
O presente trabalho apresenta duas limitações principais, a primeira das quais, o facto de terem sido consideradas apenas duas bases de dados na recolha dos artigos, o que suscita a seguinte questão: se a pesquisa tivesse recorrido a outros bancos de dados, os resultados seriam mais abrangentes? É, pois, necessário, em futuras investigações, análises complementares com outras bases de dados, para confirmar a conclusão deste estudo. A segunda limitação é a categorização dos artigos em clusters (análise de conteúdo), dado haver uma certa subjetividade, especialmente, quando um artigo aborda várias questões e conclusões. Apesar desta subjetividade, procurou-se aplicar as etapas recomendadas por outros autores para que a categorização fosse rigorosa e objetiva.
Este estudo apresenta várias contribuições. A nível prático, procura fornecer dados pertinentes às organizações privadas, do estado e não-governamentais sobre as áreas onde a intervenção do marketing social está a ser aplicado no turismo. De igual forma, procura consciencializar essas organizações para a importância da utilização, ainda pouco explorada, desta ferramenta para alcançar um turismo mais sustentável. A nível teórico, procura enriquecer o corpo de conhecimento que interliga o marketing social e o turismo através de uma análise rigorosa do seu estado de arte, selecionando um conjunto variado de documentos e utilizando técnicas complementares quantitativas bibliométricas e qualitativas para assegurar um nível mais profundo de discussão. Igualmente, a síntese presente neste artigo permite clarificar de forma mais precisa os conhecimentos já alcançados, as tendências atuais na literatura e as lacunas de investigação ainda por explorar, abrindo uma panóplia de possibilidades para futuras pesquisas. Procura ainda esclarecer que tipo de impacte o marketing social pode ter no turismo de maneira a reforçar a sua relevância como ferramenta essencial no campo do turismo sustentável. Dada a visão geral deste conhecimento, as consideráveis lacunas encontradas e os impactes negativos do turismo mencionados na contextualização teórica, espera-se inspirar os pesquisadores a focarem os seus esforços em áreas até agora pouco exploradas ou negligenciadas uma vez que existe um longo caminho ainda a percorrer neste campo científico.
autoria:
Cristina Araújo
Professora auxiliar convidada na Universidade de Aveiro
Helena Alves
Professora Associada de Marketing no Departamento de Economia e Gestão da Universidade da Beira Interior
Obs: Elementos adicionais e bibliografia disponíveis no artigo originalmente publicado na revista LOBBY Nº 01.